terça-feira, 27 de agosto de 2013

Vitrine

Caminhei tênue, num espaço branco. Tão frágil, meus sentimentos se esfacelavam perante uma caminhada infinita mirando vitrines vazias. As roupas surradas, a fronte suada, o cenho franzido. O corpo franzino que parecia não aguentar nada, pasmem, passou por todas como o vento, superou todas elas.

Eu queria poder ter sentido mais cedo, não que esteja reclamando, foi tão forte. Dentre todas as vitrines opacas, uma janela de vidro brilhava. Como podia? Minha mente estava então, de fato, amarrada ao meu corpo? Fique estático. Senti calor. Um calor que arrepiava e ondulava pelo corpo se refletindo nas células, descendo pelos olhos, passando pelo coração, se espalhando pelo sangue e tremulando as pernas como uma bandeira em tempos de guerra.

E eu te desejei. Desejei me envolver em você como o caixão é envolvido pela bandeira no enterro. Envolver-se daquela maneira inseparável, perene. Cada curva do seu corpo era um deslize do meu pensamento numa estrada à beira do abismo. As nuances atuando juntas. Eu fantasiei. Sou culpado. Meus braços percorrendo seu corpo efêmero, as ideias fluindo como uma valsa da corte inglesa. Um sorriso direcionado para o teto com olhos entreabertos. A escuridão que só poderia ser encontrada entre seus seios. E eu te toquei de leve e selvagem, te mordi. Desejei arrancar um pedaço e engoli-lo só para ter certeza de manter um pouco de você dentro de mim pela maior quantidade de tempo possível.

E eu parei de caminhar e corri pelos seus cabelos. Meu cenho relaxou e meus lábios se franziram, as roupas se desfizeram e o desejo concretizou-se. O suor misturou-se às gargalhadas lúdicas enquanto brincávamos nos campos elísios ao som da Lira de Orfeu. Era meu e seu, agora.

Por mil sóis eu poderia descrever tudo que me arrebatava, mas você me arrebatou antes. Todos os momentos grandes se tornaram pequenos e eu junto com eles, me rendi a você. A janela não se quebrava por mais que eu lutasse, mas não importava, pois transcendíamos, nos esperávamos, ávidos e sãos mesmo que loucos um pelo outro.

Eu saí de perto da vitrine relutante só com a certeza de que aquela janela não era um obstáculo, era um aviso. Ela me avisava de que muito em breve todas aquelas sensações se repetiriam, aumentadas em mil vezes, nos deletaríamos em nós mesmos e torceríamos para que o momento fosse perpétuo, para que a noite não acabasse, para que nos tornássemos um.

Voltei a caminhar, me afastei da vitrine...

E nem te olhei nos olhos.

A surpresa nos aguarda em janelas luminosas

Carmani

domingo, 7 de abril de 2013

Invisibilidade

    Jazia a madrugada em Brasília. O rapaz caminhava lentamente, o cigarro entre os dedos, sentindo a brisa frígida da noite balançar levemente os curtos cabelos castanhos. Os papéis de bala e anúncios de auto escola ao sabor do vento eram o prenúncio de que nada de bom poderia acontecer. Um aviso de que deveria ir pra casa, se remexer dentro de suas cobertas e buscar sonhos onde devemos buscá-los; no sono.
    
    Este não era, entretanto o dia em que faria isto. Ele seguia um tênue rastro de perfume adocicado que, quase imperceptível, enebriava seus pensamentos e o conduzia ao desconhecido. Como um caçador de passos leves, como o tigre à espreita da presa, ele caminhou por entre as vielas e postes em busca do seu destino. A calça jeans rasgada dificultava os movimentos. A camiseta preta, também bastante surrada, seria quase uma camuflagem se não fosse pela alva pele que se mostrava naquele rosto cheio de olheiras, todavia quase juvenil.

    Se havia alguma lembrança de há quantas noites não dormia, esta já estava perdida há muito. Se alimentava de fumaça e esperança. Era uma noite de lua nova, sem estrelas, sem calor, ríspida e indiferente. Foi quando perante um sobrado comercial, sentiu um estalo. Uma porta de metal, quadriculada em vidro, cuja pintura branca descascada não dava nenhuma impressão de boas vindas, foi o zênite de sua empreitada. Por um momento quase pensou em bater à porta, tocar o interfone e descobrir o que lhe esperava. Poderia ser desde um ponto de venda de drogas, até uma simples empresa, cujo escritório principal se encontrava vazio agora e as escuras. Poderia ser a porta do paraíso, talvez. A sua salvação ou a sua perdição. Precisava descobrir e sabia como.

    Sorriu. Não era um rapaz qualquer. Não era aquele, parado defronte aquela pequena fortaleza, alguém que precisasse de qualquer forma destas ninharias. Inspirou profundamente e fechou os olhos enquanto caminhava para a porta. Os pés flutuaram levemente por sobre os sujos degraus de pedra enquanto levitava calmamente com as mãos trêmulas. Newton se viraria na cova se visse uma cena como essa. O corpo se fundindo ao concreto na parte de cima, deixando a porta para trás, efêmero, subindo como um balão de gás. As moléculas valsando juntas no mesmo lugar, ao mesmo tempo. A impossibilidade física criada ali no lugar mais improvável, ordinário, no sentido mais literal da palavra e simultaneamente tão abstrato. Era uma residência.

    Incólume como estava do lado de fora, se viu numa sala adornada, na qual um enfeite quebrado chamou sua atenção. Era um vaso vermelho sangue. Poderia ser um vaso Ming ou qualquer adorno que se poderia comprar na torre de televisão, bastava saber o valor que tinha para o seu dono. Refletiu ali por um momento vendo os cacos que se espalhavam pelo azulejo branco. Por que ninguém havia recolhido aqueles cacos? Seria uma lembrança ou uma miragem feita pela sua cabeça? Sua mente lhe pregando uma peça, com certeza. Poderia jurar que o reflexo da luz nos cacos era como o que o sol faz na água. Se tivesse uma reflexão própria, provavelmente a encontraria ali. Mas não tinha. Caminhou por entre os cômodos esperando algo acontecer. Foi aí que a viu.

    Como uma criança despreocupada, ali estava a dona do rastro que seguiu até agora. Deitada de bruços na cama, as pernas balançando despreocupadamente no ar, os cabelos negros repousando nas costas. Como o vaso ele também se quebrou. Sentiu uma vontade enorme de gritar enquanto as lágrimas quentes surgiam no rosto e ele se despedaçava. A vontade de ser comum, ser possível, ser real para aquela moça tranquila que mexia no telefone e sorria volta e meia. Ela não fazia ideia de que ele estava ali. Um animalzinho olhava diretamente para aquilo que alguns segundos atrás era o rapaz intangível. Um monte de cacos amontoados no chão frio. Pouco a pouco, se reconstruía, se recuperava do golpe, se tornavam um novamente, seus pedaços. Um latido. Quantas vezes aquilo havia acontecido, não sabia dizer. Mas uma coisa era certa: Nenhuma das de outrora foi tão intensa, tão certeira, tão mortal quanto aquela pontada, aquele martelo que o destruiu naquele quarto. Se recompôs, finalmente.

    Assim seria sempre. Ele sabia. O homem invisível, o observador errante. Seria sempre como o vaso que se quebrava. A luz que se extinguia no poste quando nenhum carro estava passando.Ajoelhou ao lado dela e observou. Era tudo que poderia fazer. Mesmo assim, quase podia descrever com palavras o toque cálido daquelas mãos. A felicidade leve que poderiam causar com um simples abraço. Secou suas lágrimas. Era tão simples aquele momento e ao mesmo tempo tão incompreensível. Impossível de descrever o tamanho da vontade de vê-la feliz. O ímpeto dentro do peito de carregá-la nos braços, dizer que tudo ficaria bem. Esquecer de todos os outros seres reais do mundo e fazer a vida de fato valer a pena. Era mesmo uma pena. Era mesmo um sonho. Como que por um milagre, ela de repente se virou. Olhou dentro dos olhos dele e ele se sentiu um tolo por pensar por uma fração de segundo que ela poderia estar enxergando-o. Tolo. Ela fechou a janela aberta com um puxão. Ele se levantou, cabisbaixo. Abriu os braços e se deixou flutuar para trás. Não era nem poderia ser real. Alcançando a rua se misturou ao vento, jogou um beijo para ela, lhe causando um sorriso de canto de boca involuntário. E sumiu. Para sempre. Amando e desejando com a força de um trem, mas ainda assim, leve como a brisa frígida da qual agora fazia parte, quebrado como o vaso que encontrou na sala.

O começo pode ser a resposta de tudo.

Carmani

sábado, 11 de agosto de 2012

A Consciência Azul

Sim, era verdade. A pergunta que atormentava aquela pobre alma e todas as outras que banhadas em desesperança tentavam em vão alcançar o firmamento. A pergunta que deixava marcas aos pouquinhos, criando cicatrizes profundas.

Certa vez, num desabafo como este, esta pergunta ressoara milhares de vezes na cabeça de um jovem insone, que hoje, com o sono igualmente desregulado, segurava a resposta em suas mãos como o novo brinquedo de natal tão esperado pela criança.

Será que ela existe?


Levantou-se levemente da cama e caminhou até a janela. De pé no parapeito, se jogou de lá de cima. Decolou numa velocidade tão atroz que num dado instante, as próprias linhas do tempo se desfizeram ao seu redor. O tempo voltava aos poucos até aquele fatídico dia que pasmem, não era apenas um dia de nuvens. Mas que o rapaz só havia descoberto agora.

Ela preparava suas coisas, animada, como sempre, para o encontro com o seu novo pretendente. Tinha certeza que tudo seria lindo o suficiente. Ele era lindo o suficiente, claro. Eles se sentariam no centro da cidade, em meio a todo o caos e todas a pessoas atarefadas e com o cair da noite observariam as estrelas juntos. Era tudo tão perfeito! Tinha planejado cuidadosamente o local. Haveria uma toalha, muitas pessoas olhando de soslaio (como se não houvesse sempre ao nosso redor, ou você nunca reparou?) e todas as constelações do zodíaco juntas para fazer companhia ao novo e inocente casal que por vontade daquele lindo coração, agora tinha a chance de se formar. 

Ao bater a porta de sua casa para sair ao encontro do rapaz, seu coração entrou em ressonância com o batido seco da madeira e aquela onda pôs-se a viajar lenta, devagar para o seu destino incerto. Talvez se naquele momento, houvesse um pouquinho mais de força naquele batido da porta. Talvez se ela houvesse saído cinco minutos antes, talvez se aquele rapaz desconhecido tivesse pego o ônibus correto ao sair do seu trabalho, tudo tivesse sido diferente. Entretanto...

Desceu no centro da cidade e caminhou ao longo do meio fio afim de chegar até a faixa de pedestres. Os ônibus e carros pararam e mesmo que inaudível, naquele ônibus parado para aquela garota passar, fez-se um gemido de dor e um muxoxo de desgosto.

Mais um sinal vermelho? Não acredito. Parece que o tempo está fechando novamente. É claro que está! Mas só vai ficar feio mesmo depois que você realmente não tiver aonde se abrigar, seu bobão, pensou ele consternado. Sua cabeça doía muito. A caminho da faculdade, num trânsito que quase nunca pegava, Aquele garoto não reparou a transeunte despreocupada com um computador nas mãos. Ele não reparou o sorriso brilhante e os cabelos negros e curtos que faziam seu rosto tão juvenil refletir relances de femininidade que apenas uma verdadeira mulher poderia mostrar. E o sinal se abriu. E ela se foi. E ele também se foi.

Mas ele de fato reparou e sentiu de leve, um calorzinho no peito de uma velha onda que viajava lentamente através do tempo e que finalmente o havia alcançado. Esta onda viaja há milhares de anos e conecta o coração daqueles que possuem sentimentos puros e os desejam encontrar e compartilhar no outro. Não deu atenção. O mundo era outro, como poderia saber? Com tanta dor e um dia tão ruim acontecendo, como poderia ser capaz de vislumbrar que um coração de igual poder e emoção estava passando bem ali, defronte seus olhos e não havia sido perspicaz o suficiente para perceber.

Não existiam mais as nuvens de mais cedo naquele dia. As estrelas se abriam para saudar o coração e seu encontro maravilhoso e o céu dava uma trégua justa para aqueles que acreditavam e em especial para aquela garotinha que caminhava a passos apressados para perto do shopping. Sentou-se e devaneou enquanto esperava. Sentia o coração palpitar. Mais ondas, incapazes de reboar tão forte sem o bater da porta. Olhou para as estrelas que apareciam contentes, sorrindo para ela. Quando ele também chegou.

Mas as estrelas estavam apenas no céu. A companhia se tornou um buraco negro que foi crescendo através de pensamentos racionais e bobos, desconsiderações de algo tão bonito que havia saído daquele coração e que simplesmente não conseguia alcançar o coração de um comum. O coração não estava lá. Era apenas mais uma cicatriz. E o julgamento veio. E o sentimento de se sentir tola por estar ali fazendo algo para alguém que não merecia. A dúvida de se de fato, todos pensavam como aquele sem-coração e ela era a única louca, sã, mas louca num mundo de pessoas cinzas.

Então como de praxe, veio o golpe. Aquele coração não só não estava lá, como a mentira se escondia por trás do rosto. Não havia sentimento algum. Era apenas o buraco negro se manifestando novamente, tentando engolir aquele coraçãozinho perante a lascívia social de um rostinho bonito que um rufião qualquer adoraria ver sorrir por não mais que duas noites.

E mesmo que as lágrimas não tenham corrido imediatamente pelo rosto de menina, as estrelas choraram. Choraram tanto e tão forte, que o céu se fechou no mesmo cinza emburrado daquela tarde que antecedeu este fato trágico. Foi embora dali em passos rápidos, abraçada com o computador, iria para a sua casa o mais rápido que pudesse, esqueceria daquilo e pensaria na chuva que se armava para cair.

Algumas horas depois, a chuva diminui um pouco, não poderia ter diminuído enquanto o moço até então desconhecido, se encontrava espremido em meio a tantos outros infelizes numa parada de ônibus enquanto tentavam, sem sucesso se proteger do temporal que se abatia sobre eles?

A sapiência azul existia e fez sua parte mesmo que aquele rapaz pensasse num motivo diferente.Saltou do ponto encharcado, ciente de uma nota ruim, mais doente do que nunca, morrendo de fome, sem os fones, o cigarro, mas diferentemente de outrora, ele estava com o azul. Mas não soube. O motivo de seu sorriso, achava ele, seria porque naquele momento tudo seria diferente com mais uma comum. Mal sabia que estaria ainda por muito tempo longe da velha onda e longe, mesmo que tão perto daquele coração que hoje havia sofrido.

Mas não. Ele sorriu para a estrela, não para o texto da mensagem sem vida. Ele sorriu para um pequeno fragmento de luz naquele céu escuro. Sorriu, sem saber que todas as constelações do zodíaco o esperavam dali em breve. Aquela estrela era o prenúncio de que existem dias bons e ruins e que aquilo que viria a acontecer, lembraria este dia. A estrela não estava oscilando, estava piscando para o rapaz o tempo todo.

E foi assim que retornou à janela, anos depois, desprovido de suas reflexões e com um sorriso que valeria por uma galáxia inteirinha. E todo aquele sentimento que jazia próximo daquele computador, naquele dia passado, naquele momento de dor, agora se alojava num peito amplo, desejoso e recíproco. Do jeito que a garotinha merecia que houvesse sido, desde o início. E o rapaz sorriu novamente e sorriu para a garotinha que sorriu de volta para ele. Não eram mais os mesmos mas a relação das duas histórias valeu a pena:

No fim das contas, todos exisitimos

Carmani

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Assim que aconteceu...

Eu achei que estava caindo, mas estava prestes a pular.
E quando achei que tudo estava sob controle, a loucura batia à minha porta.
Quando toquei em seus cabelos, você ainda caminhava na minha direção.
Quando eu disse que te amava você ainda estava no tesão.

Eu te olhei, cão, com um olhar canino que só nós conseguimos dar, pensando ter descoberto o arco-íris, mas você não havia olhado ainda.
E quando eu achei que tinha chegado lá (no arco-íris, não no olhar) descobri que nunca tinha visto um arco-íris, que cães não vêem cores e que eu nem sabia que era um cão até aquele momento.

Foi quando o coma chegou.

Foi bem assim que aconteceu:

Eu deslizava pelos cabelos tingidos e centenas de véus cobriam meus olhos. Um ser difuso de movimentos efêmeros se fazia complexo por trás de tantos panos.

Bailava no ar como se pendurado por um cordão de móbile.

E eu me senti o bebê que tenta em vão alcançar os peixinhos acima do berço. Mas na verdade, eu me fiz peixinho. Eu era o peixinho porque todo mundo sabe que os peixinhos adorariam ser alcançados. Deve ser muito chato ficar pendurado lá o dia todo quando você tem algo tão maravilhoso, exótico e bonito logo abaixo de você tentando te alcançar.

Imagine ter estrelas fosforescentes no teto que você não pode contemplar nem contar para dormir quando você estiver sem sono. Não é um pensamento horrível?

Eu fui um peixinho por algum tempo e fiquei peixinhando meu coma, à volta dos véus, dos arco-íris desconhecidos, dos bebês inocentes e dos cães alienados até que alguma coisa me alcançou.

Os orgasmos chegaram, e foi bem assim que aconteceu:

Os corpos tremiam lúcidos nos movimentos sincronizados de um sentimento mútuo. Pouco importava o inferno ao redor. O berço de lençóis enfatizava as curvas da pele, aquela covinha do queixo que eu tanto adorava em você e aquela minha barba que te irritava tanto.

E eu afaguei a covinha e tirei a barba e mudei meu jeito de vestir e de conversar. Larguei meus amigos e segui uma vida dedicada a você. Tudo em prol do toque das mãos do bebê que finalmente tinha me alcançado. Deixei de ser peixinho. Porém não podia deixar de sentir aquilo que nenhum dos outros pendurados tinha sentido.

Mas o berço deixou de ser um leito e as grades para que o bebê não caísse se fizeram cárcere. E voltei a ser cão. Lá estava eu dentro de um aquário. Afogado em mágoas e sentimentos perdidos. Como todos os canídeos de outrora, eu descobri que não sabia que era livre.
Descobri o que era liberdade quando a coleira já estava lá.

E eu estava um passo atrás o tempo todo. A minha consciência só veio depois que era era cão, me senti como bebê, me transformei em peixinho e fui tolo.

O ser flutuando efêmero era eu mesmo desesperado tentando mostrar que havíamos nos separado. Que eu tinha tido a liberdade roubada, meu tempo perdido, meu amor.

Agora que eu enxergo minha realidade, tive uma ideia:

Vou comprar um cachorro, criar um peixe, fazer um filho e gozar até entrar em coma.

E foi bem assim que aconteceu.

Carmani









terça-feira, 23 de novembro de 2010

O Novo Mundo

Aqui estou novamente, depois de uma grande abstinência e prestes a partir do exílio em que me encontro para os braços dos meus amados. Peço desculpas ao meu desinformado leitor. Aqueles que não me conhecem de perto, não sabem que nos últimos quatro meses eu passei por uma experiência única. Eu fui capaz de valsar nas baladas dos homens apenas para confirmar todas as teorias niilistas que jazem nos recantos escuros das almas dos filósofos: Por mais que algo de bom esteja sendo feito, a maldade cobra seu pedágio.

Mas eu estou divagando, obviamente. Eu passei por alguns momentos de tristeza e agora a felicidade que me preenche é suficiente para abastecer um pequeno país. Relendo minhas antigas postagens eu fui capaz de discernir alguém que procurava algo. Hoje, como alguém que encontrou o que procurava, eu só consigo pensar em uma palavra para dizer ao belo anjo que pousou na minha vida vazia: Obrigado.

Sim, eu estou muito feliz. Feliz pelas brigas, pelos carinhos e pelo suor. Nada me faria mais contente do que poder colocá-la dentro de mim e ter certeza de que ninguém jamais a machucaria de novo. Creio porém que seria muito egoísta da minha parte não deixar que o resto do mundo soubesse a pessoa maravilhosa que está ao meu lado, bem como desfrutar dela mesmo que de maneira infinitesimal comparada com a maneira que eu tenho de fazê-lo.

Por isso, este pequeno texto de reabertura deste recanto de reflexão, nada mais é do que um desabafo para retratar a mudança do antigo autor. Tentarei ao máximo colocar pontos interessantes para aqueles que se sentirem atiçados a percorrer estas linhas com os olhos, eu prometo.

Estar ao seu lado é meu primeiro objetivo

Carmani

terça-feira, 14 de julho de 2009

Querido Diário...

É a terceira vez que apago essa postagem. Passei um bom tempo tentando recolher informações para um texto interessante mas nada encontrei além de meus próprios pensamentos. Sempre os mesmos, acabavam dando nos antigos parágrafos que eu tenho tentado esquecer.

Entretanto há coisas difíceis de se esquecer. Alguns dias atrás depois da caminhada noturna de sempre, eu viajava na minha cama fumando o último cigarro do dia quando resolvi entrar na internet por mais algum tempo. Enquanto o computador iniciava eu ficava pensando que realmente minha vida estava bem.

Pensei nos meus amigos, em como eles tem sido bons para mim. Sorri pelas pessoas novas que eu conheci e como eu deveria ter me aproximado delas antes. Me aproximei de uma menina muito legal, ela rosna às vezes mas adora cavalos e agora ela está cuidando de alguém que é quase como um pedaço da minh'alma (não é o cavalo u.u). Eu fiquei contente por isso.

Confesso que no começo eu senti um pouco de medo. Sempre que pessoas que eu gosto muito começam a namorar após passar por um longo período de abstinência (solteirice) a tendência é que o mar de rosas inicial cause um afastamento. Bom, até agora tudo corre bem e espero que verdadeiramente tenha me enganado naquelas palavras que disse antes, caso você esteja lendo isto =).

Eu quis poder pensar que tudo correrá bem mas as experiências que eu vivi dizem o contrário no que tange muitas coisas. A primeira delas é esta nova aparição (pretendo fazer um texto solo pra isto) que parece desvanecer antes mesmo de que eu possa vislumbrar seu rosto.
A segunda é aquela velha indiferença que distingue (5) TRÊS pontos de vista diferentes!!!
E a terceira é que...
óh meu Deus... O PCC VAI MATAR MEU FILHO!!

Só piadas internas, brincadeirinha. Acho que é só a primeira mesmo.
Tomara que tudo dê certo, não é diário? Tomara que eu possa continuar sem saber o que eu estou sentindo.

A idiotice é essencial para a felicidade.
Carmani

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Açougue xXXx

Tentou abrir os olhos. Inútil. O cheiro ocre de carne apodrecendo infestava seu olfato aguçado.
As pálpebras estavam pesadas demais. Seus pés não encostavam no chão. Sentia frio, muito frio.
O barulho de um exaustor infernizava seus ouvidos, não se lembrava onde estava, que dia era. O que raios havia acontecido? Onde estava e quem o levou até lá?

Sua pele estava rígida e sentia uma dor no braço direito como se o houvesse partido em algum momento. Não se lembrava do próprio nome, só pensava no frio e em sair dali. Qualquer lugar era melhor do que ali. Precisava de calor e tinha que ser rápido.


Os olhos finalmente se abriram, preguiçosos. Uma pequena luz distante iluminava o ambiente. Suas costas haviam sido penetradas por um gancho e suspendiam o seu corpo do solo numa cena macabra.
Muitos outros homens, ainda desacordados, jaziam pendurados em ganchos como o rapaz. Completamente nus, as cabeças pendendo tristemente como se fossem cientes de sua condição, não expressavam emoção alguma.

Alguns tinham cabelos compridos, outros tinham rostos angelicais. Os ferimentos variavam de hematomas horríveis no rosto até fraturas imensas nos joelhos, exceto por um único ferimento em comum: Uma ferida do lado esquerdo do peito como uma recém operação. Pontos costurados em todos eles fechando o corte pelo qual algo parecia ter sido retirado. Tentou se recolher aos seus pensamentos quando fazia como criança e escutar, sentir o sangue fluir pelo seu corpo. Mas não conseguiu, não conseguiu ouvir seu próprio coração. Eles o haviam roubado, calado-o para sempre.

Depois de algum tempo um ruído de serralheria fez-se ouvir e uma voz feminina recitava frases sentenciosas como "O problema não é você, sou eu" ou "não vou atendê-lo agora, deixarei ele pensar mais um pouco em mim" e dizia também "Já deu o que tinha que dar eu não quero me relacionar agora, tenho medo, estou confusa, prefiro não me envolver, não dará certo entre nós dois.".
Uma grande esteira, logo depois destes ultimatos, começava a funcionar levando o pobre infeliz, vítima destas palavras cruéis, até um moedor de carne. Acima dele próximo ao gancho, flutuava um coração. Logo, era depositado o coração numa bandeja e este era dilacerado até nada mais que uma poça de sangue.

Risadas? As vezes.
Remorso? Nunca.
Só aqueles perenes olhos indiferentes numa mulher fria mesmo que conhecida.
Não, não conhecia aquela mulher, não mais.
Volta e meia uma pequena pontada de ressentimento passava pelo cenho.
Raramente um sorriso malicioso, ódio.

Atrelada a um mastro por sobre um pedestal iluminado, uma representação ferida e sangrando da mesma mulher. Chorando a altos brados, sobrepunha o barulho do exaustor e enchia o recinto com a dor que só uma prisão eterna pode proporcionar.
Era o bloqueio dos antigos açougues pelo qual passara. A resultante fora aquela criatura vil que agora criava o seu próprio abatedouro, destruindo os poucos pontos de luz que ainda insistem em brilhar nas trevas.

O rapaz havia entendido. Estava dentro da cabeça de um comum. Calmamente relaxou os músculos. Sabia o que iria acontecer. Sabia também que não era a primeira vez, mesmo que não se lembrasse, que estava num local assim.
Renasceria das cinzas.
A poça de sangue se reverteria no antigo coração.
Não deixaria de acreditar.

Foi pensando nisso que levemente sorriu e deixou o corpo balançar no gancho.

Esperaria sua vez.



No dia que o último dos inocentes deixar de acreditar, a humanidade encontrará seu fim.
Carmani