terça-feira, 27 de agosto de 2013

Vitrine

Caminhei tênue, num espaço branco. Tão frágil, meus sentimentos se esfacelavam perante uma caminhada infinita mirando vitrines vazias. As roupas surradas, a fronte suada, o cenho franzido. O corpo franzino que parecia não aguentar nada, pasmem, passou por todas como o vento, superou todas elas.

Eu queria poder ter sentido mais cedo, não que esteja reclamando, foi tão forte. Dentre todas as vitrines opacas, uma janela de vidro brilhava. Como podia? Minha mente estava então, de fato, amarrada ao meu corpo? Fique estático. Senti calor. Um calor que arrepiava e ondulava pelo corpo se refletindo nas células, descendo pelos olhos, passando pelo coração, se espalhando pelo sangue e tremulando as pernas como uma bandeira em tempos de guerra.

E eu te desejei. Desejei me envolver em você como o caixão é envolvido pela bandeira no enterro. Envolver-se daquela maneira inseparável, perene. Cada curva do seu corpo era um deslize do meu pensamento numa estrada à beira do abismo. As nuances atuando juntas. Eu fantasiei. Sou culpado. Meus braços percorrendo seu corpo efêmero, as ideias fluindo como uma valsa da corte inglesa. Um sorriso direcionado para o teto com olhos entreabertos. A escuridão que só poderia ser encontrada entre seus seios. E eu te toquei de leve e selvagem, te mordi. Desejei arrancar um pedaço e engoli-lo só para ter certeza de manter um pouco de você dentro de mim pela maior quantidade de tempo possível.

E eu parei de caminhar e corri pelos seus cabelos. Meu cenho relaxou e meus lábios se franziram, as roupas se desfizeram e o desejo concretizou-se. O suor misturou-se às gargalhadas lúdicas enquanto brincávamos nos campos elísios ao som da Lira de Orfeu. Era meu e seu, agora.

Por mil sóis eu poderia descrever tudo que me arrebatava, mas você me arrebatou antes. Todos os momentos grandes se tornaram pequenos e eu junto com eles, me rendi a você. A janela não se quebrava por mais que eu lutasse, mas não importava, pois transcendíamos, nos esperávamos, ávidos e sãos mesmo que loucos um pelo outro.

Eu saí de perto da vitrine relutante só com a certeza de que aquela janela não era um obstáculo, era um aviso. Ela me avisava de que muito em breve todas aquelas sensações se repetiriam, aumentadas em mil vezes, nos deletaríamos em nós mesmos e torceríamos para que o momento fosse perpétuo, para que a noite não acabasse, para que nos tornássemos um.

Voltei a caminhar, me afastei da vitrine...

E nem te olhei nos olhos.

A surpresa nos aguarda em janelas luminosas

Carmani

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